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Das coisas que não sei


Se existe uma coisa chata, irritante mesmo, é alguém tentar mostrar pra mim como eu deveria viver, feito manual para um animal domesticado. Dizendo pra não rir da piada x, não tomar atitude y, não pensar z. Diz qualquer bobagem, dá conselhos velhos, publica qualquer livro cheio de saberes certeiros para ser feliz, coisas do tipo e sempre pensando que está certo, que sabe do outro.

foto: Alex Winter
Todo babaca parece ter convicção de tudo. Ele sempre vai ter uma opinião crucial pra qualquer assunto, inclusive da sua vida, mesmo desconhecendo como ela é. Isso quando não piora a situação usando algumas frases batidas. 

Sei lá, daqui a pouco vai ter gente falando quais são as posições sexuais mais corretas que se deve fazer, cheio de certezas e outros aderirão ao discurso. 


Estranha a cabeça de gente que pensa saber certamente sobre tudo. Acho que existem coisas tão incertas, que certeza é uma palavra que caberia melhor para o que não se sabe...

Eu, até hoje, não sei o que é coleguismo, na verdade nem entendo esse termo direito. Ou sou amiga ou não sou, uma hora amizades  acabam, a gente conserva algumas, vem outras e tal que, mas não sei o que é ser amiga pela metade. Não sei o que são os números, os mil teoremas, ausência de culpa, de exagero, amores tranquilos,  anular meus desejos por alguém, tampouco desejar algo ponderadamente.

Não sei o que é auto-ajuda,  estar sempre feliz ou sempre triste, sorrir com quem eu não gosto... Não sei me aproximar das coisas sem gestos, simples, belos, quaisquer que sejam, sem acreditar em um trabalho. Não sei amar do mesmo jeito e nem terminar relacionamentos do mesmo jeito. Não sei escrever me traindo. Não sei o que é gostar não gostando, ouvir música baixo, ver do mesmo jeito.

Ainda não sei totalmente como lidar com nossos espelhos, com o  amanhã, com os futuros mesquinhos, tampouco  onde colocar ponto final na crônica que você acabou de ler 


K.C


Confira entrevista para o Portal Interrogação aqui




Análise Combinatória



John Lennon e Paul McCartney

Simone Beauvoir e Paul Sartre

Johnny Deep e Tim Burton

Unhas e esmaltes vermelhos

Boemia e Baixa Augusta

Espelho e máscara

Pipoca e cinema

Café e leite

Arroz e feijão

Lábios e batom vermelho   

Poder e repressão


Covardia e bunda-mole

Redes sociais e fofoqueiros

Gente brega e pochete

Gente lesa e gente lesa

Piriguete e sandália de plástico

Amor e ódio

Beijo e língua

Sexo e sacanagem

Romeu e Julieta

Jack e Rose

 Capitu e Bentinho



 Palco e luzes

Rock and roll e barulho

Música e movimento

Leitura e imaginação

                                                    Paz e silêncio







Combinações sempre tem uma história, um quê, que ruim ou bom, calha a dar certo. Algumas delas são contrárias, outras são bonitas, inesquecíveis, outras indesejáveis, horríveis e outras que simplesmente se merecem.  



A gente nunca para pra pensar porque combinações existem, talvez porque  elas devem existir pra isso: 


Para que não se deixe de caminhar, para que se crie uma própria elegância ou se assuma em uma breguisse de vez. Para que o ridículo exista. Para que realidades se recriem. Para que o caos alerte cuidado e o desejo permaneça entre as belas coisas.



K.C

O Amor É Foda





Recebi emails pedindo pra que eu escrevesse uma crônica sobre o dia dos namorados no blog... e ...

Não sei se é falta de inspiração semestral, mas eu não tenho nada relevante a dizer sobre o dia dos namorados. Só tenho a dizer que na vida, e em um mundo cada  vez mais mala sem alça,  sectário, excludente, às vezes é difícil acordar e ter estômago pra  incorporar um bom humor  sozinho. 

Por isso quem tem um amor, tem que  valorizá-lo todos os dias, mesmo que ele  esteja , por algum motivo bobo ou de km, distante. Não só no dia 12.  Porque ter amor não é comemorar uma data ou ganhar uma roupa.  Ter amor é ter essência.  O amor é foda. Ele é. O amor simplesmente é, e ele é pra todos os dias. Bobo é quem não descobriu isso ainda. 


Um brinde ao amor de todo dia.             

K.C
                                    

Maldita-Bendita





Saudade é um negócio maldito. Eu vivo dizendo pra Kelly que não gosto de sentir saudades. E ela entende. Porque fico desesperada, eu não sei como lidar com a saudade. Sou fraca pra ela. Não gosto de sentir saudades de ninguém, de mãe, de amigo, de avó,  de amor, de passado, de um outro alguém... saudade ... não sei como Fernando Pessoa fazia poesias pra um sentimento que parece ser maior que o amor, raiva, ou qualquer coisa, e você não pode controlar, ao mesmo tempo  não quer sentir, mas sente. 

Sinto tipos de saudades, entendo-as, ai elas passam, eu crio outras,  suporto-as e uma hora, elas passam ou pioram, às vezes se tornam até belas. Mas não deixam de ser malditas. Parece um recado inacabado de alguém na caixa postal e você fica com aquela fissura de ouvir o resto. Um email de alguém que você adora, mas sabe que nunca vai receber.  E se receber , é melhor guardar, porque de repente você não terá nada do tipo na sua caixa de entrada novamente.

Saudade parece como correr no meio de uma estrada onde não passa ninguém que se gosta pra poder acalmar  o corpo num abraço e se for saudades de alguém que já se foi, então? Pior ainda, nem alma penada aparece na estrada. Mas quando se está vivo... É sempre um jogo. Ou você reage, ou ela acaba com você...



- Alô?

- Oi... Teca?

- Sim.

- Tá tudo bem?

- Tá... tava dormindo?

- Não. Sério mesmo, você tá bem? Parece toda... estranha...

- Tá. Eu só tava com saudade.

- Menos mal. Também to com saudade de você, até comprei um negócio.

- O que? Uma cueca comestível?

- Não , engraçadinha. Surpresa. Mas pelo seu teor de voz achava que tinha acontecido alguma coisa mais grave...

- Mas saudade pra mim é uma coisa grave...

- Eu sei, já conversamos sobre isso, mas e agora?

-Ah agora, eu melhorei. Esquece, eu não sou uma  pessoa muito normal... que espécie de pessoa gasta os míseros créditos do celular, liga pra alguém  no meio da madrugada, meio ansiosa, vê o email umas cinco vezes só pra saber se tem uma mensagem sua porque sentiu saudade...  e precisa muito falar com a pessoa... porque saudade pra ela é um negócio meio estranho, angustiante...

- Alguém realmente não muito normal...

- Hum.

- ...por isso que eu gosto de você.


A conversa continuou, mas naquele momento...  Não é que a maldita me rendeu sorrisos? Ganhou de mim,  no jogo. Mas não mudei minha opinião sobre ela, é mais ou menos como uma coisa adversária, sabe, incomoda, mas uma hora a gente é obrigado a suportar.

Quer saber? Saudade é uma bênção maldita.




K.C

Noite Travestida

Noite Fria. Garoa forte. Relâmpagos no céu que preparavam a vinda do temporal. Mas  eu preciso de um cappuccino – pensava.



A essa hora?  Tudo bem que a loja de conveniência é logo ali, mas está tarde. Eu vou.  Não, não vou, compro amanhã, deixa de ser gulosa. Sua viciada em cafeína. Vai se tratar. Mas já coloquei as botas, ta eu vou. Não vou. Não , não vou nessa garoa... Ta, eu vou.

Na loja, nada mais que uma típica loja de conveniência poderia oferecer. Congelados, petiscos, as famosas besteiras e a máquina de fazer café que eu tanto procurava... Um casal de meia idade, com pinta de que haviam acabado de sair do teatro ou coisa parecida. Um cara que não chegava a ter semblante de loki, mas parecia ser misterioso, lendo um livro....

Uma atendente de cabeça baixa, semblante blasé, com cara de quem não transava há meses. Seus olhos diziam que ela estava odiando trabalhar ali, numa noite fria. Era uma mulher que parecia estar somente travestida em um uniforme, no fundo, ela estava gritando...

Parei de divagar. Queria meu cappuccino e ir pra casa.  O dia tinha sido agitado, difícil,  reflexivo. Trabalho, faculdade,  roupas velhas doadas a um brechó, conversas sobre relações de amizade e amores que simplesmente tiveram o seu fim...

Por que que a vida passa tão rápido, a gente muda  as relações,  os conceitos, as ideologias, e nem se dá conta disso? Tão óbvio pensar isso. A gente muda porque a vida está em movimento, mas por que caminhos tão tortos e rápidos? Como tanta gente passa pela vida, assim, num clique? Não conseguia tirar isso da cabeça.



Segui a avenida que era caminho do prédio. O cara misterioso me seguiu. Fo-de-u. Ative o 190. Corra. Grite "Socorro!". Consegui chegar até a porta do prédio, e senti uma mão pesada no meu ombro, virei assustada, olhando pra cara do maluco. Ele olhou nos meus olhos e disse:

- A vida tem muitos caminhos. Ela sabe de  todas as coisas, o que poderá  ser e o que não poderá ser um dia.

- Quem é você? Qual seu nome? De onde você veio?

- Só vim dizer isso. Boa sorte, moça.

Eu hein, cara esquisito, nem me conhece... Subi as escadas do prédio pensando. Não sou religiosa. Não gosto da palavra religião. Ela afasta as pessoas,oprime, cega, pode até chegar a matar em alguns continentes e as pessoas dizem que é em nome do seu Deus,  quando na verdade são os seus egos violentos.  




Religião é um mal estar na civilização. Mas por incrível que pareça, tenho crença em um Deus. Há algo invisível que transcende o mundo. Uma espécie de força superior. Quem tem algum tipo de fé, mas não gosta de religião, nunca sabe explicar essas coisas direito. Só sente que existe.

Quem era aquele cara?  Pode ter sido Deus. Deus? Sim, Deus. Às vezes, acho que Ele gosta de ser sacana, assim. 

Deus deve se travestir de pessoas, só pra dizer uma frase travestida de coisas que nem sempre é o que se procura, mas  é preciso escutar.





E  ainda há religiosos por ai que dizem que Ele não gosta de quem se traveste... Será? 



K.C

Fim De Tarde





17:18 pm. Lago. Pôr do sol. Fim de tarde. Eu estou tão bem, mas de repente senti um vazio  e não é por causa de alguém. Foi um estopim. Um aconteceu. Um agora.

O ser humano é um animal vazio e atormentado por excelência, beiramos ao desprezível. Tentamos preencher nossos vazios, com sexo, amigos, conhaque, cheques pré-datados em lojas de shopping, uma viagem, algum livro, um trabalho, uma faculdade, uma conversa qualquer, um momento com a família, entre outros costumes.


Não, não era um vazio assim, imediato, que você preenche com coisas. Isso eu sentia, disso eu sabia. Sabia porque sinto muitas coisas durante um dia, alegria, raiva, tristeza, deboche, tédio dependendo da situação, mal humor só de olhar pra cara de alguém que não gostaria, tesão dependendo com quem estou ou do que estou fazendo, e não era igual.

Quem não se permite sentir não se perde, tampouco se encontra no caminho.  É um negócio parado, feito este lago borocochó e bonito que agora vejo. A única vez que  esse sentimento aconteceu foi quando minha avó materna faleceu. Por isso achei estranho...




Eu era criança, tinha uns cinco aninhos. Foi no meio  de uma tarde, mas tive medo de escuro, forte, coisa de criança. Quando fecharam o caixão ... , ..., ... eu não consegui olhar as memórias de uma  breve infância indo pra baixo de uma cova. “Então é assim que acontece com todo mundo? Uma hora a gente fala muito e depois resolve ficar quieto numa caixa de madeira pra sempre? E as pessoas ficam olhando ... porquê?”. Eu em minha inocência, tentando entender o que era um velório, perguntei a um parente qualquer. 

Pode ser preconceito, mas boa parte dos parentes nunca tem uma resposta convincente para os assuntos que locomovem o cotidiano. E você faz aquele sorriso amarelo e social pra disfarçar as piores idiotices que eles dizem, tipo a última moda do cabelo espichado de um certo jogador, o que ele fez, o que deixou de fazer, o último jogo, o que ele disse, super incrível...





O certo parente olhou pra minha cara com dó e não sabia o que me dizer.  Sumi do lado de todos. Eu corri e corri muito dentro do cemitério, desesperada. Fiquei dando voltas, assustada, até encontrar o estacionamento. Achava que aquele escuro iria me pegar e ninguém ia me proteger ali, nem meus pais, nem irmãos, eu ia ter que me defender sozinha, quando este chegasse. Óbvio que depois minha família , já abalada, ficou louca comigo. 

Foi ali que descobri o que são verdadeiros medos humanos. Estranho sentir isso novamente após anos. Estranho lembrar daquele acontecimento. Algo dentro de mim morreu e eu não sei o que é...

Minha avó sempre dizia em palavras, em histórias, e no seu olhar  que a gente não pode fugir das escolhas e fatalidades que acontecem  na vida. Foi uma mulher incrível e ela não sabia disso. Fumava na década de 30, coisa que hoje é meio deselegante, ruim, mas pra uma mulher naquela época era um escândalo, uma rebeldia, depois de anos ela parou. Era vaidosa, adorava batom, assim como eu.


Se apaixonou por um negão, meu avô, e enfrentou a família pra casar com ele, num momento em que o preconceito era muito mais explicito.  Perdeu dois filhos que morreram jovens, meus únicos tios, só restou minha mãe. Ficou doente, perdeu uma perna com gangrena. É, ela enfrentava a barra, mesmo depois que ficou numa cadeira de rodas.


As pessoas que a conheceram dizem que minha personalidade meio forte veio dela. E realmente, confesso que tenho a personalidade meio avessa nos ambientes que transito. Percebi que com o tempo eu tenho tratado muitas coisas que simplesmente não me interessam com indiferença. Deixado todo aquele blá blá blá de hijos de puta que não serve pra nada, comentários e pessoas que não me servem para trás.

“Você deixou de ser uma jovem garota, e se tornou uma jovem mulher.” assim sussurrou a Nona no meu ouvido, no final da tarde. “Eu acho que você está certa...”, respondi a ela em pensamento, com uma leve saudade. 


E  naquele fim de tarde, já caindo a chuva, ela me mostrou que  esse vazio não é estranho. É temer o escuro quando ele vem, é pensar no que fazer com as sombras humanas que temos dentro de nós mesmos e não podemos escapar.




K.C

Sombra Ao Espelho



Ouço sempre alguém com dor de cotovelo, ou com amor mal resolvido, em banheiros femininos de baladas, inclusive. Já estive na mesma situação. Cheguei até a fazer amigas assim. Todo mundo meio alegre, e elas lá, aos prantos, tristonhas, ouvindo  os ruídos da música que vinham da pista, os barulhos de descargas e andares de calçados, sem parar...Tem histórias de pessoas que gostam de outras, desde a adolescência “ Ah, esquece, vira a página”, eu, em vão, tento argumentar.

Os homens também compartilham seus anseios, mas não no banheiro , certa vez um deles me disse “Eu não sei o que acontece, estou com outra pessoa e feliz, nem moro mais no Estado e não esqueço a porra daquela mulher. ” – certo, esse final é um pouco dúbio, mas dá pra entender o sentimento...Dói, causa incomodo, demora pra passar essa coisa de amores mal resolvidos.  Depois de um tempo, raramente ocorre uma amizade ou fica indiferente, ou vira o extremo da insatisfação de encontrar a pessoa na rua, coisas do tipo.

A impressão do amor mal resolvido parece uma sombra nas suas costas , enquanto você olha pro espelho, rindo da sua cara, debochando, falando "Psiu. Ei, imbecil, eu ainda estou aqui, achava que ia ser completamente feliz, que eu iria embora fácil?” e ai você finge que a sombra não está ali, mas ela volta e  insiste satisfações “ ...e o que você não fez? E as coisas que não disse? Tá pensando o quê?– insiste em retrucar.




Vai um tempo para esquecer a alternativa sem x no questionário. Nos relacionamos com outras pessoas, temos novas paixões, mas aquela sombra fica um tempo ali no espelho. Parece uma maldição pesada, frívola, rogada pelo Silas Malafaia, Padre Quevedo, Pai Caboclo e Zé do Caixão juntos!

Há sempre aquela ideia vagando do e se. E se eu tivesse feito diferente, e se eu tivesse procurado, tentado, e se, e se, e se... como estaríamos hoje? As respostas? Nada mais que o desejo da velha psique. As tão sonhadas realidades que na época gostaríamos de ter feito, ouvido, ou então a única coisa boa que restaria, caso não tivesse durado: ao menos seriamos amigos.

É por essas que o amor tem que ser consumido, se meses, anos,  décadas, não se sabe, mas consumido da maneira que se pode, com todas as etapas, como um desejo que vai sendo vivido em partes , mais ou menos assim:

Você quis comprar uma coisa que considerava importante, especial. Foi na loja, ficou olhando e não tinha grana. Ai desejou, trabalhou para comprar e conseguiu. Levou pra casa com satisfação, cuidou , a ponto de brigar e não gostar que mexessem, com medo de estragar. Ela quebrou algumas vezes, você foi lá e consertou, só que por mais cautela que houvesse, aquele objeto foi ficando velho e acabou.

Tem a possibilidade do objeto não ter combinado mais ali, só que havia um carinho e você não jogou fora, e empacotou numa caixa. Passou um tempo, você abriu a caixa, viu que aquela coisa não estava tão velha assim, só que não fazia mais parte do seu mundo, se desprendeu e doou pra alguém que combinasse mais.

É assim que deveriam ser vividos os amores possíveis e é assim que eles deveriam ser refratados pra poder olhar no espelho e ver somente o  próprio reflexo.







Ou então esquece, pode ser  que pra muita gente, essa má resolução não seja um pular de etapas, e que a sombra não passe mesmo de um belo amor de pica... mas a expressão é meio equivocada. Não, amor de pica não é amor, é tara, todo mundo tem uma, mas ela já é objeto factual pra outra crônica.



K.C



E ai, quer pagar quanto?





Você chega, ele chega. Trocam olhares, conversas. Se beijam, é bom, esquenta, esquenta e esquenta e ai... foi bom pra você?

Existem muitas hipóteses pra responder a pergunta central “foi bom pra você?”. Às vezes você gostou de conhecer aquela pessoa, mas foi um momento. Às vezes foi ruim à beça e do resto é desnecessário lembrar. Às vezes foi muito bom, acontece empatia, um possível  envolvimento, algo mais sério...

Todo esse leque é aberto porque, além de não conseguirmos controlar a vida, existe a grande diferença entre: sexo casual, paixão e amor. Idiotas são os que pensam que está tudo relacionado.

Sexo é fisiológico, é ponto comum de várias sensações físicas que sentimos e não conseguimos reprimir. O pai da psicanálise, titio Sigmund, dizia em seu estudo sobre as pulsações que desde crianças já nascemos dotados de pulsação sexual e estas nem sempre tem a ver com procriação. 

Chupar o dedo, ver  pessoas se trocando,  coisas que parecem ser tão inocentes, ou até mesmo as preliminares no sexo que parecem ser mais brincadeirinhas do que parte da relação, é a sexualidade em voga. A fisiologia afeta a psique para uma descarga de sensações, entre elas as ‘coceguinhas’.

Todos os animais , humanos ou não, arranjam formas de se comunicar e de se satisfazer - as aves,  como o pinto e a periquita, inclusive. É, moralista, desculpe se lhe decepcionei com o Freud...


No sexo, há um jogo e uma excitação interessante de possuir e ser possuído. Há um tesão nisso, é uma das características da paixão. Nos tornamos  mais egoístas,  egocêntricos, vaidosos, no sexo e com o mundo,  quando estamos apaixonados.  São os nossos desejos fluindo e de mais ninguém... deve ser por isso que o sexo as vezes é confundível com a paixão, mas a experiência é diferente...


A paixão, quando não correspondida, a sensação é de que se é tão pequeno em seus pensamentos e desejos, é ruim com exclamação! E ao mesmo tempo ela é boa de sentir, difícil até de se explicar... Ela nem sempre cabe nas palavras, na concentração, no racional, as coisas parecem ter mais graça, até mesmo as coisas mais cafonas. Quando acaba... dói com exclamação?

E  essa interrogação chamada amor... acredito que vagueia na ideia de alteridade. É o outro que é colocado em foco e não você, por isso é tão difícil encontrar um amor,  porque amar está relacionado a cuidar do outro.  Nem sempre cuidar do outro envolve estar junto. Às vezes duas  pessoas se gostam, mas possuem vidas divergentes, e a forma mais sincera de você cuidar do outro é  duramente se afastar.




Quando o cuidar do outro é mutuo, ai sim se pode dizer “ eu te amo” - ao menos deveria ser assim...  e não o que a publicidade prega.

Deve ser horrível passar a vida sem saber o que é amar, mas ao mesmo tempo há uma indústria cultural  e publicitária que nos impulsiona a ficar sempre apaixonado, e não a amar. Amor é sem graça pro sistema competitivo e neoliberal que a gente vive, alteridade vende menos.

A paixão faz você ficar bobo, gastar muito mais em datas comemorativas, comprar mais roupas  e adornos afinal “tem que buscar autoestima”, “ tem que estar bonito(a) pra satisfazer seu parceiro”.  Vemos isso nas músicas românticas também,  nos filmes, o quanto a paixão em forma de amor vende mais.




É tão difícil escrever sobre isso. “ E ai, foi bom pra você?”, é uma pergunta mais abrangente do que parece, seria mais interessante perguntar "E ai, quer pagar quanto?", porque tudo depende do preço do que se quer pagar e pelo que. Sexo é fácil, mas não é de graça.  A paixão tem seu preço e o  amor , nunca sabemos quais serão os seus impostos, mas também não vem de graça.





K.C

Felicidade De Robô







O que é felicidade pra você? - me perguntaram. Na ocasião, pensei que fosse alguma cantada batida. Eu estava numa festa, e ai no finalzinho,  formaram  uma roda e começaram a discutir essa interrogação felicidade.

Estar com pessoas queridas, ter posses, amor, saúde, sexo, Deus, “felicidade não existe, só momentos felizes”, cada qual com sua opinião. Um cara qualquer na roda começou a pregar para os seus discípulos o que era felicidade, dizendo que pra ser feliz tinha que ter “jeito tal, comprar o que você deseja, pensar positivo...  porque o livro  ‘O segredo’ e blá blá blá...”, ideias típicas desses livros de muitas páginas que não dizem nada e que querem colocar na cabeça das pessoas  que existe sempre um x para “buscar o caminho” da tal felicidade.

Ser feliz parecia  fácil como  num comercial de absorvente:  você pode até não estar bem em um dia, mas existe  sempre um jeito prático e fácil de ser feliz estando... confortável? Só nós gatas garotas sabemos que infelizmente não há nada de feliz e poético em menstruar todo o mês, embora tentem vender isso.

Que fim de festa...Se discutir aquilo era um modo de ser feliz, porque é que não inventaram o livro “como se livrar da infelicidade em cinco minutos ”, pensei.

Não cheguei a  uma conclusão. Também não pensei demais sobre o mesmo. A discussão em torno da felicidade tem sido praticamente uma  imposição contemporânea. Vemos isso em comerciais de produtos que nem sempre precisamos, nos enganosos livros de autoajuda, e por conta de tudo isso, a filosofia, a história, a psicanálise, a linguagem tem tido a preocupação em discutir sobre o assunto.


Essa felicidade que inventaram é sectária: ou você é feliz, e dentro dessa felicidade existe um monte de regras pra se cumprir. Ou você é depressivo, palavra que é uma doença e que tem sido usada banalmente para qualquer angústia. As duas coisas ao mesmo tempo, então,  é o termo que mais está na moda falar “ bipolar”...


Parece que a felicidade não é mais um sentimento,  virou uma regra, e inconscientemente, várias pessoas criam a culpa de não ser feliz da maneira imposta e passam a vida procurando remédios, florais, a última igreja da estação, e os livros falsos que vendem qualquer “como" que prometem que fazendo coisa de tal jeito você será feliz, “como ficar rico”, “como beber e não ficar com cirrose”, “aprenda dez maneiras de fazer sexo sem ficar dolorido”, "como fazer seu vizinho gritar menos ", "como pegar menos trânsito"... desconfio que ficaria rica em criar títulos de livros de auto-ajuda...

No meio de tantas ideias ‘incríveis’ que tentam vender como felicidade, fica difícil entender o que ela é.  Não dão nem fôlego de pensar, é felicidade de robô.

Esta ai uma conclusão: não quero saber o que é felicidade... coisa estática, morna, de gente boba, mas procurar senti-la quando vier, com quem ou como vier. Os sentidos navegam na ideia de coisa meio aleatória mesmo, algo que produz uma sensação momentânea.

Acho que essa felicidade tem mais cara de gente, aquela que, como todo sentimento, não se sabe quando virá, o que provocará, da mesma forma que raiva, paixão, desespero, tranquilidade, excitação, também se sentem e não duram. Vem e voltam, feito gangorra, pingue-pongue, dentro da gente, enfim sentir.










Sentir é estar vivo. Às vezes é bom, às vezes é ruim, angustiante, mas tem pele. É incerto, e daí? Viver também é incerto e ainda assim a gente tenta sobreviver. 

Felicidade está em algo em que a idiota autoajuda nunca vai entender. A graça da felicidade está na incerteza de sentir.




K.C



O Desfecho




O dia parece aberto, mas está tudo fechado. Olho pra rua e só vejo sinais fechados. Corpos fechados. Conversas fechadas na sala de estar. Santo André fechada. Uma merda de transporte fechado. São Paulo fechada pra qualquer coisa nova. A internet está fechada para qualquer coisa nova. Viajar? Quem sabe, mas a droga do guichê estava fechado. Isso só  pode ser uma piada ou então devia ser só mais um fim de noite fechado, ou do mais puro azar... 

Sentei  em um dos nos banquinhos da rodoviária cheirando a Tietê. Gente lendo, correndo pra não perder o ônibus, solitárias com seu MP3, e eu observando tudo feito louca... Me dei conta de que não era o guichê, nem as cidades, nem ninguém,  fechada era eu... fechada pra balanço e nenhum pouco a fim de abrir a porta pra encontrar o óbvio.


- Que você ta fazendo aqui?

- Querendo viajar, sei lá. Quanto tempo, hein... Caramba!

- Pois é. Você sumiu...Vai viajar ainda?

- Não desisti da ideia, acho que não vai adiantar muito na minha chatice, e você?

- Eu  só vim trazer meus pais, eles estavam aqui de passagem. Quer um café?

- Quero.




Sabe aquelas pessoas que marcam sua vida por muito pouco. Por palavras, por uma atitude, ou pelas  duas coisas? Conversamos algumas horas, sobre coisas diversas, lembramos histórias engraçadas, como aquela que a gente se pegou no banheiro. Era uma viagem com amigos, numa casa de campo, todo mundo dormia... Ninguém viu. Ninguém soube... memórias.

Por um instante compartilhamos nossa falta de angustia, e chegamos à conclusão que esse era o problema. Estava tudo normal. E nada do que a gente fizesse naquele conversa deixaria de fazer parte da normalidade. Poderíamos ter saído, bebido, transado, sei lá... faz tempo que a gente não se via. Tínhamos intimidade, amizade, uma ex-paixão de colégio. Estava tarde e ambos irritados com o dia. Tudo a ver,  todos pensariam, mas...

- Vou te levar num lugar.

- Hummmm...

- É impressionante, você muda, cada hora ta de um jeito, mas suas piadas são sempre sexuais...

- Nem sempre, às vezes são taras também.

-  Brincadeira. Gosto do seu humor, chega a ser mal humorado, às vezes...

- Que pleonasmo...Ah, seu prédio? Legal, não é muito óbvio isso?

- Calma. Espera aqui.

Esperei na porta do apartamento.  Ele voltou com o celular carregado de músicas um tanto excêntricas. Não entendi nada.  

-Sobe. E fica de olho na escada pra não cair...


Fiz o sinal da cruz , subimos as escadas de serviço e estávamos no alto do prédio. Vimos o movimento das ruas, dos prédios em volta. O vento batendo no rosto. Era triste saber que no fundo somos apenas pontinhos vagando por ai, no meio de tantos prédios, holofotes. Mas era bonito ver as luzes dos mesmos e o céu estrelado. Bonito, simplesmente bonito.



- Bonito, diferente e melancólico, eu diria. Acho que isso foi a melhor parte do meu dia.

- Ta faltando a ópera...- lembrou, ligando o MP3 do celular.

- Ópera?

- É, eu li alguma coisa sua, você escrevendo  algum lance de ouvir ópera no telhado pra ficar mais calma,  fiquei com aquela ideia na cabeça. Disse pra mim mesmo que ia fazer um dia.

- Eu escrevi isso , em um momento de estresse... legal você ter lido.

- Sempre leio. Mas eu te vi e deu vontade de fazer isso: ouvir ópera no telhado com você.

- Literalmente um telhado,  a gente ta no alto de um prédio de...

- Quatorze andares... Engraçado, a gente parece um pedaço daqui de cima, né...

- Sim. As coisas parecem pedaços...



E foi ali, no alto de um telhado, que me dei conta que um pequeno pedaço de mundo pode fazer um grande desfecho.






K.C