Outro dia eu estava voltando para casa. Estava no trem, e percebi o quanto a gente vive ensimesmado consigo
mesmo, não deve ser bom, nem ruim, é um costume. Amanhecia. Momento pós-balada. Não havia muita
gente no vagão, pelo horário...
....Um estudante cheio de livros, tinha cara de ser um daqueles
novos socialistas de faculdade, meio piradinhos por Marx, uma senhorinha até
que bem vestida e a-pa-ren-te-men-te comportada, uma moça com o uniforme de um
hospital importante, com pinta de secretária, daquelas estilo “patrão vem que eu to facinho”, uma
criança barulhenta com uma mãe com jeito de acreditar ser eficaz dar broncas no
menino, um cara dormindo de ressaca, e que parecia estar três vezes bem pior
que o Mussum...
“ Me
desculpe atrapalhar a viagem de vocês...” – xi, já conhecia esse discurso,
ele é comum entre pedintes nos transportes públicos, mas era um senhorzinho que
desde minha época de cursinho pedia dinheiro para se tratar do HIV... às vezes
me dava uma loucura na ideia e eu dava dinheiro pra ele:
- Você sumiu... – o senhorzinho disse.
- Pois é, ando por ai, em outros lugares
também...
- Longe?
- Não muito, a gente se acostuma a viajar pra lá
e pra cá- e no fim percebo que tudo é
estreito-. E o seu tratamento?
- Indo...
- Toma- peguei meu troco do metrô e dei a ele.
- Não, não, obrigada, mas hoje são só vinte centavos. – disse
ele me devolvendo o resto das moedas.
- Ta...
Aquele senhorzinho deve ganhar mais grana que
todo mundo pedindo dinheiro, às vezes, acho que ele não sofre de doença
nenhuma, mas não sou alguém para
julgá-lo. O fato é que o tipo dele disfarça bem, alto, com olhos caídos, cara
acabada, magro, quase esquelético, com todo respeito, mas ele parece uma pessoa
realmente doente, terminal...
Se ele é um ator, atua bem. Se ele realmente é
doente não está fazendo algo criminoso ao pedir dinheiro pra se tratar, já que
a doença que ele diz ter tem remédios caros, enfim não sei até hoje por que o
ajudava, nunca achei que minha esmola o ajudasse em alguma coisa... mas a
minha, mais a de alguns, em conjunto, já era uma boa grana...
Desci na Estação com destino à home sweet home. Ele também desceu no mesmo local, e seguiu outra
direção. Reparei uma coisa escrita em suas costas “20 centavos não farão falta”.
Essa onda vinte centavos repercutiu, e nós sabemos o porquê. Dei uma leve
risada e pensei “... que tática de
marketing...”. E muito boa, por sinal. O modismo causa percepções diversas nas pessoas, leva-as da alienação à comoção, e
ao mesmo tempo faz com que os vinte centavos não fiquem pra’s empresas de transporte.
Se eu sou a favor da esmola? Não tenho uma opinião precisa sobre isso. Esmola pode ir muito além do dinheiro.
Só sei que no fundo, nada e tudo , nunca são vinte centavos. Por trás de vinte centavos não existe só política, existe consequências,
existe pessoas, ou até mesmo uma
história, coisas que a gente nem percebe quando se chega no destino da Estação
e a viagem termina.
K.C
Pois é, aqui no centro tem um menino que não tem a mão esquerda, faz os malabares no farol e ganha lá os trocadinhos dele. Dias que vinha conversando com ele, uma hora ele soltou... "TRABALHAR PRA QUE, GANHO MAIS DE 12 MIL REAIS AQUI SÓ RODANDO LIMÕES".~
ResponderExcluirFica aí um link http://cafehistoria.ning.com/profiles/blogs/estagiario-x-mendigo
Ocorre muito...
ExcluirMuito bom, Kelly Christi, muito bom mesmo.
ResponderExcluirobrigada :)
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